quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

Das sementes que não vendem por ai

eu plantei um sonho novo.
um lar espaçoso, poucos móveis
uma mesa de madeira
pra aguentar nossa comida.
um chuveiro grande
pro banho mais gostoso.
duas redes coloridas
penduradas bem na área
e um gato preguiçoso.

eu plantei um verão ventoso
com chuva no fim da tarde
quase quando a noite chega
pra eu chegar junto de você
com a desculpa que tá frio
e com a ternura que só Deus sabe!

eu plantei um sonho novo
e mais um monte de coisa.
e que esse monte de coisa
saiba cuidar da gente
como a gente mal sabe fazer.

eu plantei um sonho doce
e um menino brincando na areia.
eu plantei Pedro; 
e que tenhamos, Pedro, você!

eu tenho aqui esses tão sonhos
de sombra e dias tranquilos
na estação do passarinho
tocando no meu rádio antigo,
colecionando também os discos
com o chiado igual da chinela,
de quando você chega pra falar do seu dia.

eu plantei sonhos infindos
uma casa vasta e branca
com plantas pequenas e grandes.

eu plantei sonhos mil
e chega dá calafrio
de tanto nisso pensar!

camila barros



terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Fotografia da tarde no rio Taquari

daqui da minha chalana
eu vejo a mata feito sombra
se deitar dentro do rio
feito um menino com
fome sem rede e com frio.
o vento faz tremer
tanto lá como aqui
então me explica se
isso que eu vejo da minha chalana
é um corpo e uma alma separados pelo sol?
me explica, senhor
o poder das estrelas
que a noite tem preguiça,
mas não deixa de iluminar
e quando chega o dia
fica com essa de separar...

daqui da minha chalana
eu nem conto quantas coisas eu vejo.
vi muita gente virar peixe
nadando contra correnteza
será que é mesmo mais forte
quem tem tamanha certeza?
então me explica se
isso que eu vejo da minha chalana
é um corpo e uma alma separados pelo tempo?
homem vira o mesmo menino
mulher vira a mesma menina
então me explica
entra na chalana e me explica
o motivo de um só ser tantos e
de tantos quererem ser um só.

camila barros

Contraviagem

o encontro das águas
da água do teu choro
com meu choro
da tua saudade
com a minha saudade
da tua cidade
com o meu luar
bota de menino
bola de chutar.

o encontro das águas
de lavar a mão
de lavar o peito
lavar ruas de sertão
ruas de sertão enfeitado
de tanto feliz ao teu lado
por ter te visto voltar.

camila barros

Ainda falando sobre trens...

comprei uma passagem só de ida
pra lá do fim do universo
tô levando um casaco
um vinho e umas roupas
pra lá do fim do universo.

camila barros

Casa

peguei um trem
pra passear na planta baixa
da tua casa

cada porta
cada janela
cada pedaço
nos cabe nós dois.

cabe nós dois
em cada lugar.

camila barros

Da ordem do vôo

você é tão Manoel que nem vê
menina que faz do Barro um lamaçal
sem intenção nenhuma!
toma banho de mangueira
e pensa medonho e colorido
deitada na rede comendo besteira,
cantando canção de índio.

você é tão Manoel que nem sabe
você é tão sabiá que não crê.

camila barros

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

Manequim

eu escrevo teu corpo
como se cada palavra
fosse a tal possibilidade
do teu corpo

corpo manso, porém firme
longe, porém quase.

camila barros

Um calendário você

um sol
o sorriso que aparece
como quem não quer chegar
como o dia
que vem todo dia
só pra me clarear

como quem finge
não fingindo
ser assim

como quem é sol
sem saber
quando sorri.

camila barros

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Os pardais da nossa vida

era mágico e bem verde
dava pra assistir o sol nascer
do quintal da minha morada
eu tanto namorava você

namorava em pensamento
nossa música era um pardal
árvores de sentinela
pra proteger nosso varal

um jardim de planta cor
me fazia tão contente
mas tamanho dissabor
a vida deu de presente

meu quintal tem sua magia
apenas eu que cresci
são pardais que me acalmam
que ainda estão por aqui

camila barros

Sobre a doce infância que passou

pneu de caminhão
gasta tudo
automóveis
caras de bolacha
desabafam
docemente

choro de menino
faz a vida
meio primo

automóveis
gastam tudo
bicicletas
escondidas

move o tempo
pra direita
a esquerda
já passou

tic tac
embalado
na garupa
da minha bike.

camila barros